quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Dalai Lama ensina ética a banqueiros (outubro 2012)

Matéria do The Daily Beast sobre participação de Sua Santidade, O Dalai Lama, no Simpósio sobre Ética para um Mundo mais Próspero, do Instituto Legatum, em Londres, Reino Unido, 23 de Outubro de 2012.
Dalai Lama treina financistas em ética secular
“Sou um budista marxista”, diz o Dalai Lama, e todos os banqueiros na sala inspiram profundamente. “Quando eu era jovem, eu queria entrar para o Partido Comunista Chinês.” Sua Santidade dá uma risada como uma chaleira assobiando, e procura um lenço de papel entre as dobras de seu manto para limpar os óculos. Existem vários outros monges vestidos de açafrão e marrom na sala de conferência, todos sorrindo com benevolência. Eles foram reunidos por financistas de alto nível com ternos listrados como os dos grupos JPMorgan Chase e Blackstone, e advogados de empresas, contadores, analistas políticos, empresários e acadêmicos. O encontro improvável aconteceu em Mayfair, Londres, no Instituto Legatum, um centro de estudos dedicado a encontrar abordagens inovadoras para o mercado livre, no século 21. “Desde a crise, a busca de um sistema financeiro mais ético tornou-se uma questão chave”, diz Jeffrey Gedmin, Presidente da Legatum. “Estamos buscando perspectivas surpreendentes sobre isso.”
“Temos de levar as pessoas a confiar em nós novamente”, diz um diretor de um grande banco de investimento dos EUA (a maioria fala anonimamente).
Os banqueiros parecem tietes na presença do Dalai Lama, apesar de um toque cauteloso. (“Ele é um pouco casual com a palavra ganância”, observa um). Sua Santidade fala com epigramas como Mestre Yoda: “Caridade sem coração é como roupas baratas da China: parecem boas no começo, mas logo desfazem”, seguido por aqueles risos estridentes.
“Será que o sistema financeiro pode ser melhorado com a introdução de mais regras?” indaga Dalibor Rohac, economista Checa e diretora da Legatum, que usa um lenço amarelo de bolinhas.
Os financiadores riem disso. “Você pode fazer todas as regras que quiser, mas as pessoas sempre vão encontrar uma maneira de contornar”, diz um contador. “Afinal de contas, não há nada de ilegal em contas off-shore”.
“O governo não pode ser uma mãe”, diz o Dalai Lama. “Isso é como os tempos feudais, quando se esperava que um líder divino dissesse o que fazer.” Sua atitude relaxa um pouco os financistas. “O que você acha de altos impostos sobre os ricos, Sua Santidade?”, Pergunta alguém. “Os ricos devem dar aos pobres, mas doação voluntária é muito melhor”, ele responde. “O mais importante é que os pobres acreditem que possam conseguir algo por si próprios.”
“Nós não somos todos como Bernie Madoff”, insiste o diretor de um fundo de gestão internacional. “O problema é estrutural: o ciclo de ganhos tornou-se tão curto que você pode só pensar em dinheiro rápido. No passado, havia empresas que eram de propriedade familiar, religiosas, enraizadas na comunidade. Mas, em um mundo globalizado, nenhuma dessas se mantém. ”
Desde a crise financeira, tem havido tentativas de retomar alguns desses valores. As empresas classificadas como “corporações de benefícios”, como a empresa de roupas Patagônia, são obrigadas por lei a gerar benefícios para a sociedade, bem como a seus acionistas. Jitesh Gadhia, diretor da Blackstone e participante do evento, ajudou a apresentar o juramento de negócios globais, que entre outras coisas diz “Dirigirei minha empresa com lealdade e cuidado, e não avançarei em meus interesses pessoais às custas da minha empresa ou da sociedade. ”
Embora atualmente sejam poucas, tais iniciativas se alinham à mensagem do Dalai Lama, que enfatiza mudanças no comportamento do indivíduo, em vez de uma dependência de regulamentos. Como ele escreve em seu livro mais recente, Beyond Religion: Ethics for a Whole World: “Em última análise, a crise financeira foi gerada pela ganância – a falha em empregar a moderação e contenção apropriadas na busca cega por lucros cada vez maiores.” O Dalai Lama propõe um treinamento em “ética secular” para neutralizar esta situação. “A pressão arterial baixa quando há um comportamento mais ético – os estudos têm mostrado isso”, diz a Sua Santidade aos banqueiros com uma gargalhada.
“O treinamento em ética nas instituições financeiras não é necessariamente novo”, diz Jules Evans, autor de Philosophy for Life and Other Dangerous Situations e acadêmico da Queen Mary, Universidade de Londres. Ele cita o plano ético de cinco pontos do Citigroup elaborado pelo ex-CEO, Chuck Prince, e lançado em 2005, em meio a um escândalo regulatório. As práticas incluíam uma hotline para ética e a exigência de formação para todos os 260 mil funcionários. No entanto, como observa Evans, três anos depois, o Citigroup estava apostando alto no mercado imobiliário dos EUA e na venda de títulos hipotecários prejudiciais a seus clientes.
“A maior parte dos treinamentos em ética são realizados superficialmente”, disse Evans, que está projetando novos treinamentos mais fundamentais. “A idéia é criar um espaço onde os funcionários possam regularmente se questionar se suas ações são éticas, e – igualmente importante – possam dizer a seus patrões se considerarem que seu comportamento é errado.”
O Dalai Lama diz que a formação ética deve ocorrer nas escolas, com aulas de ética secular trabalhadas em currículos. No entanto, o problema começa ainda mais cedo,  acrescenta:“Se você tem o carinho de sua mãe, então você tem contentamento. Mas se não há carinho de mãe, as pessoas se tornam gananciosas, irritadas, inseguras.” Ressaltando os valores da família, responsabilidade pessoal, e ceticismo do governo, o ” budista-marxista” soa mais como um conservador compassivo. O Dalai Lama e os banqueiros têm mais em comum do que se poderia pensar.
O Dalai Lama se despede, e os banqueiros, acadêmicos, empresários e especialistas correm para tirar uma foto com ele. “Posso tirar uma foto com você para a minha mãe?”, Pergunta um. “Ela não acreditou que iria me encontrar com você.” Com uma fila de monges em direção à saída, os diretores de bancos de investimento e gestores de ativos internacionais estendiam suas mãos para dizer adeus. Ao invés de apertá-las, os monges tomavam as mãos dos homens, pressionavam-nas em meio às vestes em seus corações e seguravam-nas por alguns instantes, o tempo todo assentindo a seus colegas com os olhos sorridentes.
Tradução: Jeanne Pilli
fonte no blog brasileiro: aqui