terça-feira, 3 de novembro de 2009

A Escola Madhyamika ou «Via do Meio»


A experiência e compreensão da vacuidade, segundo a visão da escola Madhyamika ou «Via do Meio» - na esteira de Nagarjuna (sécs. I-II), o reputado mestre indiano da universidade monástica de Nalanda -, liberta a mente de toda a tese extrema, eternalista/essencialista ou niilista, que afirme uma entidade permanente e intrínseca nas coisas ou as considere absolutamente não existentes, emancipando-a de toda a opinião ou posição acerca da natureza das coisas, incluindo de si mesma, segundo as quatro possibilidades de pensar e dizer algo a respeito de algum objecto: que é, não é, é e não é, nem é nem não é. Assim se suspende o regime discursivo da avidez e apropriação conceptual, que troca o real por palavras e entificações: «Abençoada é a pacificação de todo o gesto de apreensão, a pacificação da proliferação das palavras e das coisas» [Nagarjuna]. A experiência directa, não conceptual, da vacuidade de tudo inclui a própria vacuidade, que não pode jamais ser entificada ou convertida numa nova perspectiva, consistindo antes no esvaziamento de todas elas (e assim no seu próprio auto-esvaziamento, não devendo sobreviver a si mesma, como posição substituta e alternativa das que se abandonam): «Os Vitoriosos proclamaram que a vacuidade é o facto de escapar a todos os pontos de vista. Quanto àqueles que fazem da vacuidade um ponto de vista, declararam-nos incuráveis» [Nagarjuna]. Como se sugere na primeira estância de Nagarjuna aqui citada, esta experiência tem um sentido libertador e soteriológico, que Shantideva aponta mais nitidamente: «Quando algo e a sua não existência/ Estão ambos ausentes da mente,/ Sem outra opção,/ Livre de conceitos, repousa perfeitamente».

Paulo Borges, «Posso imaginar-me tudo, porque não sou nada. Se fosse alguma coisa, não poderia imaginar» Vacuidade e Auto-criação do Sujeito em Fernando Pessoa in (Org.) Paulo Borges e Duarte Braga, O Buda e o Budismo no Ocidente e em Portugal, Lisboa, Ésquilo, 2007, pp-361-362

Imagem: www.rigpawiki.org/images/6/67/Buddhapalita.JPG

2 comentários:

Paulo Borges disse...

Caro Kunzang Dorje, os meus textos são como acender fósforos na plena luz do Sol de Nagarjuna e Shantideva...

Grato por revê-lo aqui. Volte também à Serpente. A experiência do samsara é já a do nirvana...

Kunzang Dorje disse...

Caro Paulo,

envie-me então o convite. Grato por tudo...